Fonte: MilkPoint
“Misturar para lucrar” é o lema de inovações que estão mudando a forma de produção e o visual da paisagem em fazendas do oeste baiano, fronteira do agronegócio.
O avanço está na interação entre dois protagonistas que tradicionalmente se mantinham afastados, cada qual no seu “quadrado”: lavoura e gado. A união exige mudanças produtivas, como na estratégia do grupo Triunfo, em Formosa do Rio Preto (BA): após o período de cria e recria, o boi é levado para engorda não mais em áreas de pastagens exclusivas à pecuária mas sim em meio ao cultivo de grãos.
Na propriedade agrícola, o capim não mais é um intruso. Plantado para alimentar os animais e fornecer forragem à melhoria do solo, tem permitido safras nas estações secas, com maior rentabilidade e ganhos ambientais.
O modelo resulta em menor necessidade de novas terras para agropecuária, o que significa redução do risco de desmatamento e de emissões de carbono. “Onde passa o boi se produz mais soja”, atesta o produtor Eduardo Manjabosco, um dos sócios das fazendas, no total de 14,7 mil hectares de grãos. “A integração com o gado é importante para se obter mais palhada, na lógica do ganha-ganha”, reforça o produtor.
A trajetória se iniciou quando o pai migrou do Rio Grande do Sul para o Cerrado, no fim da década de 1980, mas não conseguia evoluir na produção agrícola devido à estação chuvosa bastante curta. Para obter a forragem necessária ao manejo do solo, via plantio direto, a solução foi cultivá-la em consórcio com o milho e utilizá-la após a colheita das espigas. Além do uso no preparo da terra para a soja, o capim (braquiária) passou a servir também como pasto, depois que o grupo entrou no ramo da pecuária, inicialmente visando nutrir os bezerros com os resíduos da lavagem de grãos.
“Em algumas regiões, em especial as que apresentam solos de baixa fertilidade, os produtores estão colocando pastagens para viabilizar a agricultura”, diz Robélio Marchão, pesquisador da Embrapa Cerrados. Na soja, o ganho de produtividade é de 10 a 15 , além do aumento de matéria orgânica no solo e da maior eficiência no uso de água e nutrientes. Em paralelo, a pecuária integrada à lavoura se beneficia por técnicas que revigoram espécies forrageiras, com aumento de quatro vezes na produtividade animal.
De acordo com Marchão, o sistema integrado tem potencial de reduzir as emissões de gases de efeito estufa em até 50 . “A manutenção da capacidade produtiva das pastagens é tão importante quanto a sua recuperação”, enfatiza, ao lembrar que grande parte dos 101 milhões de hectares de pastagens cultivadas no país encontra-se em processo de degradação. Na visão do pesquisador, a intensificação produtiva sustentável “é um dos grandes desafios da produção de alimentos no sentido de reduzir pressão sobre o meio ambiente”, afirma.
“O olhar se volta para a fazenda como um sistema único, em que uma coisa está ligada à outra”, aponta Julia Mangueira, coordenadora regional da The Nature Conservancy (TNC) no Mato Grosso. Na região da BR 163, a organização apoia a adequação ambiental de produtores de soja, com práticas que conservam o solo e reduzem desmatamento. No Vale do Araguaia, o objetivo é o manejo adequado de pastagens em 59 fazendas. Renata Pollini, gerente de sustentabilidade da empresa de insumos Syngenta, parceira das iniciativas, indica o próximo passo: “desenvolver métodos para quantificar o valor monetário dos serviços ambientais”.
O aspecto econômico é visto como essencial ao engajamento. Na região de Água Boa (MT), o pecuarista Braz Neto, 28 anos, diz que o desafio é o diálogo entre gerações. Para o produtor, sócio da Agropecuária Sucuri, com 3,5 mil hectares de pastagens, biodiversidade e emissões de carbono fazem parte da agenda, trabalhada a partir de um plano de intensificação produtiva e práticas sustentáveis, visando mercados de carne mais exigentes.
“Os avanços dependem da visão generalista, e não especialista, do produtor”, destaca Angelo Gurgel, pesquisador do Centro de Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas – instituição que coordena o Observatório ABC, dedicado a monitorar os financiamentos do Programa Agricultura de Baixa Emissão de Carbono, do governo federal.
Na safra 2018-2019 deverão ser liberados R$ 2 bilhões em crédito subsidiado para mitigação de gases de efeito estufa no setor. Desse total, R$ 585 milhões se destinaram até o momento à recuperação de pastagens e R$ 73 milhões a sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta. “Estamos apenas no início da curva de crescimento, mas há grandes incertezas diante da possível redução de subsídio federal do Plano Safra”, afirma Gurgel.
As informações são do jornal Valor Econômico.
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